Relativamente ao treino do “core”, existe muita controvérsia acerca do melhor método de treino, bem como acerca das suas reais funções. Existe uma corrente que diz que não é necessário nada além de exercícios compostos no programa de treino (agachamento,peso-morto,etc).
Outra corrente de pensamento parece fazer do “core” a coisa mais importante do mundo e passa tempo infinito a tentar pensar em modos de aumentar a activação deste, mesmo que em detrimento do trabalho desenvolvido pelos outros grupos musculares.
Onde estou eu? Algures no meio, que, como em quase tudo, é onde está o bom senso. Isto é o mesmo que dizer: depende do objectivo e da pessoa em causa. Primeiro que tudo, vamos às funções do “core”.
Funções do “core”
Segundo o Dr. Stuart McGill, provavelmente o maior especialista em coluna lombar do mundo, os músculos do core servem como estabilizadores e não como “promotores de movimento”, sendo que a sua principal função é a de garantir que a coluna lombar permanece na sua posição mais resistente (neutra), mesmo aquando da ocorrência de movimento noutras articulações.
Posto isto, podemos dividir as funções deste grupo muscular em:
– Anti-flexão
– Anti-flexão lateral
– Anti-rotação
– Flexão
– Extensão
– Rotação (ocorrendo nas articulações correctas e não na coluna lombar)
Curiosamente, ou talvez não, e ainda segundo o Dr McGill, as posições de flexão, rotação e flexão lateral da coluna lombar (bem como combinações destas) fazem com que a resistência da mesma ao trauma diminua drasticamente. Este professor universitário e investigador verificou mesmo que a flexão repetida da coluna lombar danifica os discos vertebrais. Mas vamos ver como podemos introduzir estes exercícios, mais à frente.
Segundo Shirley Sahrmann, a função do “core” é:
- Estabilizar apropriadamente a coluna;
- Manter o alinhamento óptimo e as relações de movimento entre a bacia e a coluna;
- Prevenir traumas excessivos e movimentos compensatórios, durante a ocorrência de movimentos nas extremidades;
Parecem-me familiares estas recomendações. Resumindo, devemos trabalhar com o objectivo de adquirir:
- Mobilidade na articulação coxo-femural
- Estabilidade na coluna lombar
- Mobilidade na coluna torácica
Para quem está familiarizado com o funcionamento articular e as “necessidades” destas mesmas articulações, o que disse acima não deve representar uma novidade, uma vez que é conhecido que o nosso corpo é formado por uma espécie de camadas articulares, com necessidades diferentes de estabilidade e mobilidade.
Assim, e apenas para melhor compreendermos as razões das funções do “core”, podemos estabelecer a seguinte ligação:
Articulação -> Necessidade
Tornozelo -> Mobilidade
Joelho -> Estabilidade
Anca -> Mobilidade
Coluna lombar -> Estabilidade
Coluna torácica -> Mobilidade
Escápulo-torácica -> Estabilidade
Gleno-umeral -> Mobilidade
Para definirmos o método de treino indicado ou para sabermos como organizar o treino do core, importa esclarecer os objectivos, uma vez que o método de treino para hipertrofia é diferente do método de treino para performance ou apenas para a população geral.
Treino para a população geral
Aqui estamos a falar de uma pessoa normal. Uma vez que o objectivo é optimizar o funcionamento deste grupo muscular e corrigir/aperfeiçoar padrões de movimento, esta seria uma progressão aceitável para estabilização/anti-rotação:
1) Prancha lateral com determinada duração (variando o ângulo consoante a resistência e força da pessoa; Prancha frontal
2) Posteriormente introduzir a ocorrência de movimento mais acima, para aumentar o grau de dificuldade; Reverse crunches
3) Em último caso, introduzir a rotação (mais uma vez, apenas no sítio certo); reverse crunches, ab rollouts
Tendo em conta que defendo que cada grupo muscular deve ser treinado 2x por semana (eu gosto de colocar o trabalho abdominal no dia de pernas), podemos dar um exemplo de treino:
1a – Exercicio principal de pernas ( agachamento ou peso morto ou variações)
1b – Exercicio de mobilidade articular consoante a necessidade
2a – Exercicio unilateral com ênfase no quadricipetes
2b – Flexões ou variação
3a – Exercício para a cadeia posterior
3b – Reverse crunches
4a – Gémeos
4b – Prancha lateral
Treino para hipertrofia
A única diferença é que, se desejarmos induzir hipertrofia num grupo muscular, temos que aumentar progressivamente a tensão que colocamos nesse mesmo grupo muscular, durante um determinado período de tempo. Ao mesmo tempo, sabemos que o treino isométrico não é eficaz para induzir hipertrofia, pelo que, após uma fase introdutória, devemos dar primazia ao treino dinâmico, com fases excêntrica e concêntrica controladas.
Estas indicações têm em conta aquilo que a literatura estabelece como frequência óptima para hipertrofia, que é 2 vezes por semana. Aconselho a que se utilize uma mescla de treino “pesado” e treino metabólico, tanto para o treino de core como para qualquer outro grupo muscular.
Podemos organizar o treino de 2 modos:
– Um dia de treino de tensão, com pesos, e um dia de treino metabólico, com séries mais longas e menos resistência
– Um exercício de tensão, seguido de um exercício metabólico, realizados no mesmo treino e repetidos mais tarde nessa semana (pode ser com exercícios diferentes).
Conclusão
Como podem ver, a escolha de exercícios não tem que ser muito diferente, apenas o cuidado que temos com as progressões, sempre tendo em conta o custo e o beneficio que temos com cada decisão.
Os princípios básicos são os mesmos e o mais importante de tudo é respeitar as necessidades articulares e padrões de movimento correctos. Quantas vezes já vimos pessoas a realizar rotações com carga duma forma atroz? Eu já vi muitas e a responsabilidade é de quem tem a função de educar mas não o faz.
Há sempre quem diga que os Pallof presses não fazem nada e que seria necessário ter a ocorrência de rotação para que fosse eficaz. Será? É tudo uma questão de progressão, e mesmo assim vamos tentar evitar ao máximo o movimento na coluna lombar.
Na minha opinião deve começar-se pelo trabalho de estabilização e, depois sim, progredir para o trabalho de rotação, caso seja necessário para a execução das tarefas diárias da pessoa em causa. Nunca, mas mesmo nunca, se deve começar por estes últimos.
Autor: Ta Fitness
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